Ana Pompeu - Correio Braziliense
Quando o tempo fecha e a água começa a cair, além da atenção redobrada para evitar colisões, os motoristas não podem tirar os olhos do asfalto. Os buracos aparecem e se tornam armadilhas. Cheios de água, muitos ficam escondidos. Especialmente em dias como o de ontem, quando o brasiliense enfrentou quase 20h ininterruptas de chuva. Em todas as cidades do DF, é possível encontrar rachaduras e até algumas crateras nas pistas. Especialistas ouvidos pelo Correio afirmam que o asfalto do DF tem boa qualidade se comparado ao de outras regiões do país, mas é preciso fazer manutenções com mais frequência e levar em conta o aumento do número de veículos que trafegam pela capital.
Na madrugada de ontem, um buraco na Estrada Parque Guará (EPGU), próximo ao zoológico, deixou vários carros com pneus estourados e rodas amassadas. Embaixo de muita chuva, os motoristas faziam fila na pista para trocar os compostos ou esperar pelo guincho. Por volta das 10h, dois cones sinalizavam o local do perigo. Perto dali, na via de acesso do Setor Policial para o Eixão, um imenso galho de árvore foi colocado para alertar os motoristas quanto a um novo ponto de risco.
O aposentado João Soares, 61 anos, estava de plantão ao lado do carro do filho, o vigilante Henrique Sérgio Santos de Sousa, 34, que teve dois pneus estourados no local, por volta das 7h, quando ia do trabalho para casa. “Vimos cair quase 10 carros desde que chegamos. É, no mínimo, humilhante. Ele saiu cansado, trabalhou a noite toda, paga os impostos e parece que não tem direito a nada”, desabafou João Soares. Ele conta que mora no P Sul, em Ceilândia, onde também encontra buracos em várias vias.
No período chuvoso, o asfalto antigo, sem manutenção ou de baixa qualidade transparece em forma de rachaduras e buracos. O especialista em engenharia civil Dickran Berberian explica que o asfalto tem quatro camadas: o revestimento asfáltico, na superfície, às três na base. “Se o material não for bom, a espessura não for adequada ou se a base não estiver bem compactada, os buracos vão aparecer. Considerando um pavimento benfeito, mas que está se deteriorando antes do tempo, a causa deve ser o aumento do fluxo de veículos que passa por ele ou o peso de cada um”, detalha o professor da Universidade de Brasília (UnB). Ele diz ainda que o país tem tecnologia e conhecimento satisfatórios para construir pistas de qualidade, mesmo em comparação a países desenvolvidos. Bastaria, segundo Berberian, ter vontade política e a verba necessária.
Outro fator que contribui para o surgimento das fissuras no asfalto é a falta de um sistema de drenagem eficaz. “Quando a água atinge a base do pavimento, que deve ser compactada, ela se racha e os problemas aparecem. Nesse caso, o correto é refazer o trecho”, avalia a professora de engenharia civil da Universidade Católica de Brasília (UCB) Renata Conciani. O diretor de urbanisimo da Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap), Erinaldo Sales, explica que a empresa está levantando os pontos críticos do DF para quantificar os valores necessários para as reformas e levar ao governo.
Trabalho aos domingos - Durante as chuvas, de acordo com Sales, tapar buracos é a única opção. Ele garante que a quantidade de equipes que a empresa tem disponível é suficiente para atender à demanda da época. “A gente procura os intervalos sem chuva para reforçar o trabalho. Quando não dá para começar pela manhã, vira o caos, mas aí começamos a operar às 16h e vamos até a noite, como hoje (ontem). Também vamos trabalhar extraordinariamente aos domingos”, salienta.
A Novacap informou que comprou 35 máquinas para reforçar as operações tapa-buracos e de recapeamento. Elas estão atuando desde o mês passado. Enquanto o maquinário antigo é capaz de tapar 200 deles diariamente, o novo, orçado em R$ 3,5 milhões, consegue fazer até 600. Em 2011, a Novacap utilizou 180 mil toneladas de massa asfáltica para os serviços de reparo nas pistas, dispondo de R$ 50 milhões. Cada caminhão caçamba pequeno, usado em operações usuais, leva em média cinco toneladas.
Os moradores do Recanto das Emas esperam que a cidade esteja na fila para receber a operação. A situação da pista de mão dupla na entrada da cidade é lamentável. Os motoristas têm de subir na calçada para desviar de uma cratera ou invadir a mão oposta. As pessoas que aguardam um ônibus na parada sobem no assento para não se molharem com a água que espirra dos buracos. “É um problema para os pedestres também. Eu mesma tenho um filho cadeirante e fica impossível andar com ele quando a rua está assim”, reclama Maria Lima de Jesus, 47 anos. Ela morava em Ceilândia. Mudou-se para o Recanto das Emas há quatro meses e os problemas permaneceram os mesmos. Nas duas cidades, ela tem dificuldades em pistas esburacadas ou irregulares.
Volume acima da média - Em 10 dias, o Distrito Federal registrou 53% do volume de chuva previsto para o mês de janeiro, o que corresponde a 131 milímetros. A média de chuva para este mês é de 247mm. Segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), a previsão é de que continue chovendo bastante até amanhã. De acordo com a meteorologista do Inmet Maria das Dores de Azevedo, a média de janeiro deste ano ainda pode se normalizar. “Se parar de chover agora, ficamos abaixo do esperado, mas a umidade do ar está elevadíssima”, afirma. A umidade mais baixa de ontem ficou em 86%. Maria das Dores diz que, na sexta-feira, o brasiliense deve ter uma trégua. Por enquanto, o volume de água foi tão alto que a Companhia Energética de Brasília (CEB) abriu três comportas da barragem do Lago Paranoá na manhã de ontem. Segundo a CEB, as comportas só serão fechadas quando o nível voltar a baixar. O lago estava 1,78m acima do nível do mar. O máximo que ele suporta é 1,8m
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