Autoridades anunciam investigação e medidas para universalizar o direito à cidadania.
Leonardo Prado
Moradores de rua deram depoimentos durante a audiência.
Jacinto Mateus classificou a situação de “genocídio” dos moradores de rua e citou casos recentes do Distrito Federal para afirmar que essa violência é contínua e quase diária. “Quero lembrar Josué Neves Lima, que teve a cabeça esmagada na hípica, no dia 6 de fevereiro deste ano; José Edson Miclos, que foi queimado em Santa Maria, no dia 25 de fevereiro; quero lembrar um desconhecido que, no dia 21 de fevereiro, foi encontrado às margens da BR 060, dentro de um carrinho; quero recordar Adriano Bispo de Oliveira, Ivaldo dos Reis Serra, ambos executados a 300 metros de uma delegacia; Ulisses Cruz Onório, que foi espancado até a morte e jogado dentro de um container, em Taguatinga, no dia 4 de março; e agora, dia 2 de abril, o Fábio Costa, que foi assassinado na (quadra) 109/110 Sul. Nós estamos acompanhando um processo de higienização terrível”.
Ações na saúde
O responsável pela divisão de atenção básica à saúde do Ministério da Saúde, Alexandre Teixeira Trino, apresentou detalhes de uma pesquisa realizada pelo Ministério do Desenvolvimento Social sobre os moradores de rua no País.
Segundo o levantamento, quase 52% das pessoas que vivem nas ruas possuem algum parente na cidade em que moram, mas deixam de estar com essas pessoas por questões como alcoolismo, consumo de drogas, desavenças familiares ou desemprego.
O mesmo estudo apontou que, embora mais de 70% dos moradores exerçam alguma atividade remunerada, cerca de 20% delas não consegue se alimentar ao menos uma vez ao dia.
Grupo de trabalho A deputada Érika Kokay (PT-DF) anunciou que vai propor um grupo de trabalho na Comissão de Direitos Humanos com dois objetivos básicos para a população de rua. “Que esses agentes públicos que supostamente cometeram crime contra a população em situação de rua – e, particularmente crianças e adolescentes, o que é um agravante – sejam devidamente punidos, a partir de uma apuração com rigor. E que possamos ter, de fato, uma política pública intersetorial para o conjunto da população em situação de rua”.
Érika Kokay, que preside a CPI da Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, também ressaltou a necessidade de reverter preconceitos cristalizados na sociedade.
Depoimentos Durante a audiência pública, o coordenador do movimento contra o albergue de moradores de rua de Brasília, Luiz Cesário, causou polêmica ao associar essa população a bandidos e a fazer críticas contundentes ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA – Lei 8.069/90).
Segundo o representante do movimento, o albergue mantido pelo governo do Distrito Federal no bairro do Areal, em Águas Claras (DF), é um estorvo para os residentes na região e deveria ser fechado. “Depois que inventaram esse estatuto, todo estupro e todo assalto que tem dentro de Brasília e do Brasil tem um menor envolvido no meio. Os moradores de rua, os albergados, fazem sexo em plena luz do dia, na porta da gente. Tem travesti no albergue que se depila em plena luz do dia. Chegou ao ponto de um funcionário do Banco Central matar dois ou três. Para um homem concursado que ganha bem chegar ao ponto de matar um morador de rua, imagina o inferno que era a porta desse cidadão”. Luiz Cesário deixou a audiência debaixo de vaias.
Durante a audiência, o secretário de Desenvolvimento Social e Transferência de Renda do DF, Daniel Seidel, admitiu que o albergue da região do Areal tem funcionado em situação precária.
Outros moradores de rua passaram a dar depoimentos emocionados, como foi o caso de Ivone Reis, que passou 23 dos seus 29 anos de vida na rua e hoje trabalha como cabeleireira e monitora da ONG Giração. “Eu nunca fui marginal. Eu fui estuprada por dois PMs na rodoviária e não denunciei. Para que denunciar? Para gente sair como mentiroso e marginal? Hoje eu trabalho, não estou mais nas ruas e achei alguém que acreditou em mim. Muitos moradores de rua têm sonho. Quem falou que nós não sonhamos? A gente não quer esmola. A gente quer um emprego, a gente quer oportunidade. É disso que a gente precisa.”
Ao final, a coordenadora da equipe de Saúde da Família Sem Domicílio da Secretaria de Saúde do Distrito Federal, Sandra Duarte, listou ações que serão desenvolvidas nos próximos meses para melhorar a situação dos moradores de rua em Brasília.
Reportagem – José Carlos Oliveira Edição – Regina Céli Assumpção
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