As denúncias de um policial contra o ministro Orlando Silva
ressuscitam acusações que envolvem o governador Agnelo Queiroz,
investigado no STJ pelas mesmas suspeitas de desvio de dinheiro
público do Programa Segundo Tempo
Foto: Sérgio Lima/Folhapress |
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PASSADO SUSPEITO O ex-ministro do Esporte e governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, diante de grafite nas obras do Estádio Nacional, em Brasília. Ele não conseguiu se distanciar do escândalo em sua antiga pasta |
Nos primeiros meses do ano passado, a política do Distrito Federal passou por uma
crise sem precedentes. A Operação Caixa de Pandora, deflagrada pela Polícia Federal
no fim de 2009, expôs uma rede de corrupção comandada pelo então governador,
José Roberto Arruda (DEM), com consequências diretas na sucessão local. Arruda
foi afastado do cargo e impedido de disputar a reeleição, o que aumentou as chances
dos outros concorrentes.
Ganhou força a candidatura de Agnelo Queiroz, ex-ministro do Esporte, filiado ao
Ganhou força a candidatura de Agnelo Queiroz, ex-ministro do Esporte, filiado ao
Partido dos Trabalhadores pouco tempo antes, depois de duas décadas de militância
no PCdoB. Quando ainda lutava dentro do PT para ser escolhido candidato a
governador, Agnelo foi atingido por uma grave denúncia. No ano passado, a
Polícia Civil do Distrito Federal concluiu uma investigação sobre desvios de
verbas do Segundo Tempo, principal programa do Ministério do Esporte, em
convênios firmados com duas entidades de kung fu. Ambas eram comandadas
pelo policial militar João Dias Ferreira. As investigações apontaram indícios
de envolvimento de Agnelo nas irregularidades dos convênios, como revelou
ÉPOCA em maio de 2010. O inquérito da Polícia Civil tinha o depoimento de
testemunhas que diziam ter entregado R$ 256 mil em espécie a Agnelo.
Responsável pelo caso, o delegado Giancarlo Zuliani Júnior, da Polícia Civil,
Responsável pelo caso, o delegado Giancarlo Zuliani Júnior, da Polícia Civil,
concluiu que, por envolver verbas do ministério, as investigações
deveriam ser encaminhadas a autoridades federais. Zuliani sugeriu novas
providências, entre elas o rastreamento dos telefones celulares de Agnelo e
das pessoas com quem teria se encontrado na entrega do dinheiro. Em setembro
deste ano, o procurador da República José Diógenes Teixeira pediu que o inquérito
fosse transferido para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), que comanda
investigações contra governadores.
O caso ficou adormecido até a semana passada, quando o policial João Dias
O caso ficou adormecido até a semana passada, quando o policial João Dias
acusou o atual ministro do Esporte, Orlando Silva, de irregularidades na pasta,
entre elas o recebimento de dinheiro desviado de convênios. No processo do
STJ, no entanto, a autoridade mais envolvida nas acusações é Agnelo Queiroz.
É a primeira vez que, nesse processo, o nome do atual governador aparece na
Justiça Federal. Pesam contra ele as acusações de ter recebido os R$ 256 mil
e a proximidade com João Dias. Em viagem à Europa, Agnelo disse na semana
passada que só teve relações políticas com João Dias nas eleições de 2006.
Segundo o inquérito, porém, era mais que isso. Testemunhas descrevem festas em
que Agnelo e João Dias estiveram juntos – como o aniversário de uma filha de Dias.
Em nota a ÉPOCA, Agnelo afirma que, como político, sempre compareceu a festas
de aniversário – e não se recorda de eventos específicos.
Gravações telefônicas autorizadas pela Justiça mostram que, nos momentos difíceis,
João Dias sempre recorreu a Agnelo. Em uma das conversas, Dias pede sua ajuda
para preparar sua defesa em um processo na Justiça. Segundo a polícia, Dias temia
uma ação civil pública em que o Ministério Público Federal cobra a devolução aos
cofres públicos de R$ 3,2 milhões desviados do Ministério do Esporte. Dias nega ter
feito esse pedido. Ele diz que foi gravado quando pedia ajuda a Agnelo contra
as “sacanagens” feitas para jogar em suas costas a responsabilidade pelos desvios
de dinheiro do Segundo Tempo.
Não adiantou. Em abril de 2010, João

Dias foi parar atrás das grades por
causa dos desvios de dinheiro do
Ministério do Esporte repassado
a suas entidades. De acordo com o
relatório da polícia, na manhã do dia 5
de abril, após a prisão de Dias, sua
mulher, Ana Paula Oliveira, tentou falar
por três vezes com Agnelo – ela deixou recado pedindo a indicação de um advogado
para seu marido.
Com a chegada de Agnelo ao governo, Dias sentiu-se prestigiado. Há 20 dias,
Com a chegada de Agnelo ao governo, Dias sentiu-se prestigiado. Há 20 dias,
porém, lançou o blog Em Rota de Colisão, em que fez ameaças ao governador
e ao ministro Orlando Silva. Prometia denunciar os esquemas de corrupção no
governo de Brasília. O que ele queria? “Fiquei revoltado com a demissão do
Manoel Tavares da presidência da Corretora BRB (banco do governo de Brasília).
Ele é meu amigo e saiu porque não concordou com a roubalheira”, disse Dias a ÉPOCA.
João Dias postou no blog a foto de um Honda Civic preto, com os dizeres “Carrinho
João Dias postou no blog a foto de um Honda Civic preto, com os dizeres “Carrinho
que ainda vai assustar e abalar a estrutura política do Distrito Federal”. O que quis
dizer com isso? “Foi por causa do Geraldo”, diz ele. Trata-se de Geraldo Nascimento
de Andrade, principal testemunha contra Agnelo na acusação de recebimento de
dinheiro. Sócio de uma das empresas usadas para desviar recursos do Ministério
do Esporte, Geraldo confessou o crime, delatou seus parceiros e se tornou
réu colaborador da Justiça. Em depoimento à polícia, disse que, entre os dias
7 e 8 de agosto de 2007, sacou o equivalente a R$ 335 mil em uma agência do
Banco de Brasília (BRB) para pagamento de propina. Desse dinheiro, ele diz ter
colocado R$ 256 mil em uma mochila. Acompanhado de Eduardo Pereira
Tomaz – principal auxiliar de João Dias nos projetos pagos pelo programa
Segundo Tempo –, ele diz ter entregado a mochila a Agnelo, em um estacionamento
de uma concessionária de motos.
Apesar das ameaças, no depoimento que prestou à Polícia Federal, João Dias
Apesar das ameaças, no depoimento que prestou à Polícia Federal, João Dias
disse desconhecer o envolvimento de Agnelo com os problemas no Ministério do
Esporte. Ele confirmou as denúncias contra Orlando Silva, mas disse a ÉPOCA
não ter participado de entrega de dinheiro ao ministro. “Não entreguei e não vi.
Quem me disse que por várias vezes entregou dinheiro para o ministro, inclusive
na garagem do ministério, foi o Fredo (Ebling, dirigente nacional do PCdoB).
O Fredo vivia lá em casa, deitava no sofá e falava do esquema de arrecadação do
PCdoB no ministério”, diz Dias. A ameaça de denunciar Fredo como responsável
pela arrecadação de dinheiro do PCdoB, em Brasília, foi a principal arma de João
Dias para tentar engavetar os relatórios de fiscalização do Ministério do Esporte
contra suas ONGs. “Contesto todas as acusações. Só estive uma vez na casa de
João Dias, em 2006, para deixar material de campanha, pois nós dois
éramos candidatos”, diz Fredo Ebling. “Nunca falei sobre arrecadação com ele e,
depois da campanha, não estive mais com ele.”
A pressão sobre Orlando Silva aumentou ao longo da semana passada. Na
A pressão sobre Orlando Silva aumentou ao longo da semana passada. Na
terça-feira, epoca.com revelou que uma empresa venceu na sexta-feira 14, com
uma proposta R$ 20 milhões mais cara, uma licitação para a compra de uniformes
no programa Segundo Tempo. Muitas novidades sobre o caso ainda deverão vir à
tona. ÉPOCA descobriu que Agnelo é citado em outro inquérito da Polícia Civil, que
apura desvios de dinheiro em convênios firmados entre a ONG Novo Horizonte,
dirigida por Luiz Carlos Coelho de Medeiros, e os ministérios do Esporte e da
Ciência e Tecnologia. Uma testemunha disse à polícia que Agnelo favoreceu
a Novo Horizonte como forma de retribuir o apoio financeiro de Medeiros nas
eleições de 2006, quando Agnelo foi candidato ao Senado pelo PCdoB. Estagnadas
por mais de um ano, as investigações agora tendem a avançar na Justiça.
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Por Andrei Meireles, Marcelo Rocha e Murilo Ramos
Fonte: Revista ÉPOCA - Edição nº 701
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